Núcleos habitacionais há décadas irregulares, alvo de inúmeras tentativas fracassadas e imberbes de regularização, e ainda em processo de negação absoluta, como se a irregularidade não existisse.
Em alguns momentos, porque a legislação não continha dispositivos suficientes para promover a regularização e os consultores ou profissionais careciam da “coragem” suficiente para dizer que o serviço contratado seria mera tentativa.
Outros, porque sequer tentaram, sob a alegação de supostos erros por parte da administração causaram a irregularidade e que caberia ao estado, como um todo, promover sua regularização.
Ainda outros, inconformados com a ausência de informações ou lentidão dos municípios ao se manifestar, não entendem que um processo administrativo fraco, mal ordenado e formulado, tende a causar insegurança jurídica para aprovação e culmina com dezenas de exigências que, de fato, não levarão a parte alguma.
Verdade seja dita. já estamos encontrando escritórios de consultoria dando preços, “um pelo outro”, a preços irrisórios, antes mesmo de organizar a documentação para verificar o grau de complexidade envolvido naquela regularização específica, pois cada qual tem suas particularidades, sempre relevantes.
E já surgem os casos em que fica claro que essa “pequena” taxa se prestava apenas para acompanhamento da documentação e que os titulares, para atender exigências, em tese, descabidas do Município, terão que atualizar levantamentos, produzir estudos ambientais, negociar compensações, e desembolsar, gastar, enfrentar!
Ou os casos em que o preço se presta única e exclusivamente para produzir o material técnico inicial, sem observar a legislação vigente, e que uma vez concluído, padece de uma série de providências técnicas e administrativas que vão emperrar sua aprovação e manter os titulares patinando na incerteza.
Esses profissionais lançam mão de uma proposta de varejo, para conduzir os contratantes a um caminho sem volta, onde ele paga o que a mais for requerido porque já gastou aquela quantia inicial e não pretende perder o investimento. Nesse momento, o consultor ganha por atacado!
E quem está certo? Quem está errado?
Todos e ninguém.
A legislação brasileira na área de gestão territorial tropeça a passos de tartaruga há mais de quatro décadas.
A ausência de regulamentação sempre deixou a matéria ser decidida pela discricionariedade de agentes públicos, não importa seu ânimo ao analisar os processos, e condenou os requerentes ao excesso de exigências, de fato, muitas vezes descabidas.
Mas olhemos o outro lado da moeda.
Tivessem empreendedores e compradores engajados na aquisição de algo apenas depois de comprovada sua regularidade, não viveríamos essa crise.
E favores a parte, muitos se trocaram entre aqueles que detinham poder e os administrados pedintes, que clamavam por soluções.
E vamos combinar que o segundo, terceiro e quarto adquirente usam a fraca desculpa da boa-fé para desculpar a aquisição de imóvel por metade de seu preço, confiante de que o Estado é incapaz e ineficaz e que ele comprou uma galinha morta que se transformará na galinha dos ovos de ouro algum tempo depois.
E aquilo que poderia ser resolvido em uma assembleia com 50 ou 200 pessoas, será objeto de brigas, discussões e tensões familiares entre os 300 ou 1000 herdeiros, que se verão a frente de uma passivo horroroso, onde além da propriedade irregular, precisarão tratar com as falências, insolvências e tantos outros problemas que atravessam a causa e que, a cada ano, dificultam sua regularização.
Alguns casos, de forma isolada e circunstancial, podem até ter sido resolvidos, à margem da lei, com algum “jeitinho” e provavelmente serão esquecidos, num momento em que a irregularidade alcança tamanho percentual que não se pode parar para vasculhar o passado.
Mas na atual fase “big brother”, esse jeitinho brasileiro começa a dar mostras de superação. A atuação do Ministério Público, cada vez mais presente, traz mais e mais obrigações àqueles que não se mobilizam em busca de soluções.
Agora, não se pode alegar que inexiste legislação específica para solucionais esses núcleos irregulares. A nova legislação federal, Lei 13.465/17, trouxe novas ferramentas e instrumentos que superam as dificuldades anteriormente existentes.
E embora muitos proprietários ou representantes legais se mostrem profundamente incomodados com o termo, ele são absolutamente “irregulares”, não importando mais a causa, a não ser para fins de fundamentação da regularização que se pretende.
E não. Não é um trabalho simples.
E não, os agentes públicos ainda não foram capacitados para enfrentar todas as complexidades envolvidas na matéria e andamento administrativo da aprovação.
E eis que chegam os “pseudo” condomínios.
Em hipótese alguma eles consentem em ser chamados de núcleos irregulares ou informais.
Em todos eles, esse ressentimento presente em relação à municipalidade. E em ambos, a presença de sentimento equivalente por parte dos funcionários, que acabaram de chegar e precisam lidar com complicações causadas por irregularidades que perduram há mais anos do que se possa contar nos dedos.
E a isso somam-se os profissionais contratados com pouco ou nenhum preparo, conduzindo processos altamente complexos, sem contar com equipes multidisciplinares e o conhecimento necessário ao debate, consenso e negociação, elementares na REURB.
Mais ainda, saber que muitos profissionais ainda lidam com a questão de forma política, distorcendo a natureza do processo e seu andamento.
E não vamos esquecer que depois de tudo pronto e aprovado, nova labuta se inicia. A discricionariedade dos registradores, que aguardam atualizações de provimentos que levam anos em preparo e permitem interpretações dúbias e insatisfatórias, culminando com exigências que já se tornam verdadeiras pérolas na matéria.
Então, aos representantes e titulares do futuro imóvel carente de regularização: cuidado ao contratar, muita calma para escolher o melhor caminho e muita serenidade para enfrentar, “novamente”, o procedimento de regularização fundiária que está por vir!
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